Somos atores num espetáculo sobre Hamlet. Não conheço o rosto de nenhum dos meus companheiros de cena, mas nosso figurino passeia pelos tons de terra, verde musgo e branco. O chão é forrado por um lençol claro amarrotado. O ponto alto, antes da conclusão da peça, é uma cena de uma grande batalha de espadas da qual todos participamos. Nessa noite, o ator principal, como de costume, distribui as espadas. A luta começa. No primeiro golpe, porém, sangue. Sangue real, espadas reais. Ninguém parou a cena. Houve uma espécie de aceitação imediata da escolha que o ator principal nos fizera. Sabíamos que isso vinha dele e de uma certa forma, havia uma subserviência velada, aceitávamos sua superioridade quase espiritual sobre nós. Não pararíamos. Não improvisaríamos, abraçaríamos o jogo. Daríamos nosso sangue, anestesiados pelo transe emocional da cena, pela honra ao ofício e por aqueles que estavam ali para nos assistir. Antebraços sangravam. O figurino e o lençol claro do chão, assim co