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Mostrando postagens de novembro, 2015
Nessa  urgência de ser maior por dentro: rasgar essas amarras internas, sangrar e cicatrizar ao mesmo tempo. Esmurrar a idéia de mim mesma e abraçar, consolar, me curar, me dar um beijo. Caçar a sombra que eu projeto mas nem vejo e incorporá-la, a sangue frio- mesmo com medo... Transbordá-la, transcendê-la, vir às claras Para então ser luz que cega e anulá-la. Virar do avesso num esgotante recomeço... Testar as novas crenças a partir de um novo dentro... Talvez aí more o acerto.

Vontade, muita... mas ainda não sei como lidar com o que você pode ocultar fora do alcance do olhar. Perto é bom, porém... entre este perto e o seguinte... além do que sei. Medo, ainda. Deixando fluir no tempo... Construindo momentos, aos poucos. Moldando o presente, descobrindo passados, tateando o caminho, percebendo as verdades. Cedo, ainda... Teremos base? Escolheremos ficar? Ou haverá sempre outros olhos a distrair o olhar? Questionamentos, estranhamentos, encantamentos... Eu escolho arriscar.
Cinco horas da manhã. Anouar, marido de Malika, preparava o café da manhã para a família, como fazia desde que Anass nascera, o primogênito. Em seguida vieram Ahmed e Fouad. Três homens. Malika já estava satisfeita, mas Anouar queria ter tantos filhos quanto uma mulher fosse fisicamente capaz de parir. Quando engravidou pela quarta vez, Malika logo providenciou as tentativas de aborto. Falhou em todas e Boutaina nasceu. Da quinta gravidez, quase nem se deu conta. Ter filhos já havia virado um hábito. Saloua veio ao mundo e não teria sido a última se o casamento não houvesse falido. Cinco partos normais, sem anestesia, como era natural que fosse.  Depois de passar um pano úmido na mesa, Anouar distribuiu sobre ela os utensílios do café: na cabeceira, uma bandeja de prata com um par de garrafas térmicas. Amarela para o leite integral, azul clara para o café preto. Torrões de açúcar num potinho de vidro, colheres e copos. Ao centro da mesa uma cesta de pão. Fatias de manteiga sem s
« Quero retocar as raízes e cortar um pouquinho aqui na nuca.” Claude preparava seu equipamento. Amin estava rodando por perto, arrumando um vaso fora de lugar aqui, ajeitando outro ali. Malika o observava pelo espelho. Não podia deixar de imaginar que ele teria um caso com Claude. Censurava com força seus pensamentos, pois não conseguia deixar de imaginar o que fariam os dois quando se encontravam a sós. Decidiu que deveria de imediato distrair-se com outro assunto. Olhou desesperadamente ao redor, tentando encontrar algo que prendesse sua atenção. Como se os céus houvessem entendido seu desespero, a campanhia tocou. Entrou uma senhora magra, alta, portando divinamente um legítimo tailleur Chanel numa cor que não se definia entre um verde azulado e um azul esverdeado. Seus cabelos eram de um branco intenso, lisos, na altura dos ombros, penteados cuidadosamente para dentro e, se ela não estivesse entrando num salão, dir-se-ia que ela havia acabado de sair de um. "É inglesa",
  Dez e quinze da manhã. Um pouco atrasada, mas nada grave considerando o senso de pontualidade marroquino. Balançou o pulso afastando as pulseiras de ouro, esticou o dedo e tocou a campainha. Barulho de passos, silêncio. Alguém atrás da porta certamente ficava na ponta dos pés para acertar o buraco do olho mágico, colocado numa altura mal planejada. Um senhor de aparência agradável abriu a porta e em seguida um sorriso. “ Bonjour madame, tfâddal ” disse com uma voz macia, incomum aos homens árabes, fazendo sinal para entrar. “ Merci" , disse Malika, entrando . «  Vous êtes ...?” “  Amin, et vous, madame, chnou smik? ” Perguntou seu nome na comum mistura tangerina de árabe com outras linguas. « Madame Malika. Marquei com o Claude às dez horas, espero não ter atrasado muito...” “Oh, non, pas du tout, ma keine hta mouchkil .” Sem problema. «  Installez- vous  ». O lugar tinha ar de certo refinamento, diferente dos outros salões. Uma cristaleira a
Não era usual que Malika questionasse suas atitudes. Era impecável demais para sequer cogitar uma autoanálise. Isso significaria a aceitação da possibilidade de erro. Num dia normal, afastaria imediatamente qualquer reflexão sobre suas ações. Possuía como ninguém a cega certeza da inquestionabilidade de seus atos. Porém, hoje, ela acordaria com uma inquietação atípica. Ainda na cama, sem abrir os olhos, sentia-se inerte como se seus membros fossem toscos pedaços de chumbo. O dia longo se anunciava a uma parte já semi-desperta de seu espírito e ela recusava essa idéia. Planejava virar-se de lado em busca de uma posição que a permitisse dormir mais um pouco. No entanto, o esforço físico exigido para o menor movimento parecia sobrehumano. Sua consciência começava a dar sinais de vida, mas ainda sem comando sobre seu corpo. O quarto se revelava timidamente na pouca luz que conseguia receber às seis horas de uma manhã de inverno. Era obviamente o maior quarto da casa, com uma eno